A liberdade de expressão é muito bonita até ao dia em que dizemos algo sem pensar, por brincadeira ou malícia, e isso se vira simplesmente contra nós, com efeitos devastadores na carreira que tanto trabalho nos deu a construir. Na dúvida, é melhor guardar estes tópicos só para si no emprego.
Texto de Ana Pago
DIZER QUE ALGUÉM É INCOMPETENTE
Há sempre funcionários incompetentes em qualquer emprego e todos sabem quem eles são. “Porém, se não podemos ajudá-los a melhorar nem demiti-los, também não ganhamos nada em divulgar a sua inépcia”, alerta Travis Bradberry, autor best-seller de Inteligência Emocional 2.0 (ed. Marcador) e presidente da TalentSmart – a consultora de topo que trabalha com mais de 75% das empresas da Fortune 500, a incluir as maiores corporações dos EUA por receita total. É da TalentSmart este estudo que indica, após sondar mais de um milhão de trabalhadores, que apontar as falhas de alguém poderá ser interpretado como insegurança da sua parte e até dar a ideia de que está a tentar subir às custas dessa pessoa. Além de que se já todos sabem quem são os incompetentes, para quê repisar o óbvio?
AMBICIONAR O POSTO DE OUTRA PESSOA
Por mais que detestemos o que fazemos, desejássemos estar noutro lado e já só trabalhemos pelo dinheiro ao fim do mês – tudo aspetos que não convém andar por aí a apregoar demasiado alto, já agora –, o caso assume proporções diferentes se anunciar abertamente que está interessado no cargo de outra pessoa. Isto porque os bons funcionários torcem pelo sucesso da equipa como um todo e não apenas pelo seu, explica Travis Bradberry, aludindo àquilo a que chamamos de “vestir a camisola”. Sendo assim, ambições laborais em conflito com os interesses das pessoas com quem trabalhamos é visto – com maus olhos – como egoísmo e indiferença face aos colegas e à empresa, diz.
AFIRMAR QUE DETESTA AS SUAS FUNÇÕES
Quase tão mau como cobiçar o cargo alheio é estar constantemente a refilar com o seu próprio cargo e o tanto que detesta tudo o que lhe pedem para fazer no dia-a-dia. “Este é um comportamento que vai rotular a pessoa de negativa, não como alguém que faz parte da equipa, além de arruinar o ambiente laboral”, sublinha o especialista em inteligência emocional da TalentSmart, lembrando que pelo caminho há sempre substitutos empolgados à espera de uma de uma oportunidade para ocuparem esses lugares.
FALAR SOBRE O SEU SALÁRIO
Será um assunto palpitante para os almoços com os pais e avós. Já no trabalho, se puder evitar, mantenha o salário longe das conversas com os colegas, inclusive daqueles com quem se dá bem, sabendo que arrisca mais reações negativas do que positivas (especialmente da parte de quem trabalha muito e recebe pouco). “É impossível atribuir salários com perfeita justiça, e revelar o nosso dá aos outros colaboradores uma medida direta de comparação”, explica o consultor, ciente de que essa franqueza nunca traz bons resultados: “A partir do momento em que todos sabem qual é o seu rendimento, o que quer que faça será confrontado com o que recebe.”
COMENTER A SUA VIDA SEXUAL
O facto de ela ser espetacular ou primar pela ausência não interessa para nada em termos laborais, já que em teoria nunca irá discutir a sua vida sexual com ninguém do trabalho. Ou pelo menos não devia, avisa Travis Bradberry – nem mesmo naquelas ocasiões que lhe possam parecer propícias a desabafos mais íntimos em grupo. “Alguns comentários podem fazer uns colegas rir, mas deixarão a maioria desconfortável e talvez até ofendida”, insiste o influencer do LinkedIn, profundo conhecedor da realidade das empresas. Atravessar esta linha dá-lhe instantaneamente uma reputação duvidosa que não vai querer carregar.
AQUILO QUE PENSA SER A VIDA SEXUAL DOS OUTROS
Uma segunda linha que nenhum funcionário deve pensar em atravessar é a de fazer conversa acerca da vida amorosa de algum colega (real ou imaginária) ou especular sobre a orientação sexual, gostos, parceiros e outros tópicos que apenas dizem respeito ao próprio. Segundo o consultor best-seller, não existe forma mais certeira do que esta para afastarmos os outros e colocarmo-nos a jeito para sermos criticados: “Cerca de 111% das pessoas que trabalham connosco não querem saber o que achamos do desempenho delas no quarto”, reforça Bradberry.
CONTAR COMO ERA REBELDE NOS TEMPOS DE FACULDADE
Ainda de acordo com o estudo da TalentSmart realizado junto de mais de um milhão de pessoas, o passado está lá, não desaparece com a idade, fará sempre parte de quem somos. O que significa que as nossas desobediências e rebeldias de estudantes – incluindo noitadas loucas ou comportamentos impróprios em público – deverão permanecer guardadas mesmo depois de adultos, já que ninguém irá acreditar que mudámos assim tanto. “Quem trabalha connosco vai pensar, sim, que ainda hoje podemos não saber controlar-nos nem quando devemos parar”, traduz o presidente da consultora americana.
APREGOAR O QUANTO GOSTA DE BEBER
O mesmo princípio de pensamento aplica-se às loucuras com o álcool: por muito que goste de beber, se divirta alcoolizado ou tolere bem a bebida, opte por manter este tópico fora das paredes do escritório, de preferência com amigos que não trabalhem consigo. “Pode pensar que referir como ficou inebriado no fim de semana não influencia minimamente o modo como é visto no emprego: afinal, se é bom trabalhador continuará a sê-lo, correto?”, questiona Travis Bradberry. Errado, responde o próprio: “Os colegas não nos vão ver como pessoas divertidas e sim imprevisíveis, imaturas e com falta de bom senso, à luz das suas opiniões negativas sobre drogas e álcool.”
COLOCAR A SUA VIDA NAS REDES SOCIAIS
E que dizer daquelas imagens em fato de banho, a flutuar numa boia de flamingo ou a beber um coco na praia que partilhámos nas redes sociais? Foram umas férias maravilhosas e não nos excedemos em nada, mas isso talvez não impeça os colegas de nos verem com olhos menos profissionais. Ou o nosso chefe de pensar se seremos, de facto, a pessoa certa para chefiar o departamento na próxima promoção. O truque é separar a vida pessoal da profissional também aí, sugere o consultor. “Deixe o LinkedIn ser a sua rede social para as pessoas do trabalho e liberte o Facebook para todas as outras”, diz.
CONTAR PIADAS OFENSIVAS
Podemos nem dizê-las por mal. Ou contá-las a achar que são genuinamente divertidas e não têm mal nenhum. Mas se por acaso tivermos dúvidas quanto à possibilidade de virmos a magoar alguém com o que vamos dizer, então mais vale nem sequer começarmos, frisa o autor de Inteligência Emocional 2.0, considerando que umas poucas palavras bastam para fazer grandes estragos. “Piadas ofensivas fazem os outros sentir-se horrivelmente e fazem-nos a nós parecer horrivelmente, além de terem muito menos graça do que as piadas inteligentes.”
FALAR SOBRE AS SUAS CRENÇAS POLÍTICAS E RELIGIOSAS
Se diferenças religiosas e políticas estão na origem dos grandes conflitos que sempre marcaram a história, não é difícil imaginar os estragos que discussões do género podem fazer no emprego. “Discordar das ideias de um colega pode rapidamente alterar a perceção forte que ele tinha de nós, já para não falar que confrontar os valores de alguém é das coisas mais insultuosas que podemos fazer”, explica Travis Bradberry. “Opiniões políticas e crenças religiosas estão tão profundamente enraizadas nas pessoas que desafiar os seus pontos de vista torna mais provável sermos julgados por um colega do que mudarmos a maneira como pensa.”
ADMITIR QUE PROCURA OUTRO EMPREGO
Há pouco falámos em vestir a camisola, quando o colaborador está alinhado com a estratégia empresarial e motivado por ela, mas na verdade a camisola também se despe. E o modo mais rápido de fazê-lo, conclui o estudo da TalentSmart sobre atitudes equilibradas no local de trabalho, é revelar que se está à procura de um novo local de trabalho – no fundo, uma outra forma de dizer que estamos fartos do atual e a desencontrar-nos da visão da empresa que já fez sentido para nós em tempos. “Ao anunciar que planeamos sair, de repente tornamo-nos uma perda de tempo para toda a gente”, confirma o presidente da consultora, aconselhando os demissionários a só contarem se tiverem certezas ou uma alternativa laboral.